Ao acordar, ainda deitada, vi seu olho direito. Aberto e
desperto. Segui adiante e vi um azul sereno pintando o céu que se desnudava na
janela. Recuei. O olho direito. Redondo e negro como jabuticaba, fixo na metade
de meu rosto. Um olho novo, sem costume em me ver.
Meu olho esquerdo se dividia entre o mundo que nascia lá
fora, e o que nascia ali. Lá e cá. Perambulando na superfície.
Um pio. E outra vez. No terceiro pio o olho direito
voltou a mim, piscava doce e lentamente. Pela retina passava alguma de coisa de
brinquedos, andanças, medos, certezas, uma vida inteira de viver nenhum.
O olho olhava sem saber se aquilo que era visto valia.
Valia um dia, umas manhãs, um café. Eu também não sabia se valia, se valíamos,
se valia pensar. Sentia.
O mistério que saia do olho não me convidava a
descobri-lo, apenas a dançar no escuro. Meus pés tomados rodopiavam,
giravam... Pétalas se desfaziam em meus
dedos, sentia minha carne quente, meu sangue apressado, o girar, o torpor...
O vento por onde passa aviva as folhas, sacudindo-as,
tirando-as do marasmo. De repente, como veio, se vai. Seguindo por outras
estradas, atalhos, vielas, becos e avenidas.
Sacudindo outras folhas, arrancando-as de si mesmas. Algo parecido com esse olho sozinho.
Sacudindo outras folhas, arrancando-as de si mesmas. Algo parecido com esse olho sozinho.
Em um instante que me distraí, o olho direito sumiu.
Passado algum tempo, o encontrei junto com o outro, o que
ficou debaixo da coberta naquela manhã. Extasiados, ressacados, trôpegos pela
voracidade da noite...
O olho direito me olhou. Viu que eu ainda gosto de dançar
no escuro...
Nenhum comentário:
Postar um comentário